sábado, 12 de outubro de 2013

Dona Cila

1) A artista: Maria Gadú

     “Essa menina nasceu com a bunda virada para Lua!” dizia minha avó. Essa expressão antiga e bem humorada dá o tom do quanto uma pessoa é sortuda e abençoada pelo Universo – situação que comporta bem a divina Maria Gadú. Imaginar seu semblante é ter a certeza do encontro de um brilho imenso no seu olhar que apresenta um quê da doçura do universo infantil!
     Sua voz ecoa pelo Brasil (e mundo!) há 4 anos quando gravou seu primeiro cd com canções próprias, e desde então, sua legião de admiradores só aumenta -  inclusive com o reconhecimento de dois nomes da MPB. O mito Milton Nascimento gravou comercial com ela para homenageá-la: “Eu sou muito fã dela e só tenho a agradecer por ela ter me convidado – ela prova que é realmente amiga!”
       Já o ícone Caetano Veloso chegou a gravar um DVD com ela – registro histórico de duas gerações – e a fazer uma turnê que passou por 6 cidades brasileiras. “Fizemos uma ‘excursão’. A Maria tem uma musicalidade autêntica e também tem uma afirmação da personalidade muito espontânea.”
     É, “Maria, Maria” não está neste mundo a passeio. É gente que chega para iluminar, o timbre da sua voz tem o dom de me fazer flutuar na posição da flor de lótus!

2) A composição

       “Dona Cila” é uma grande homenagem para sua avó que morreu há alguns anos. “Na vida, sempre fui eu, minha mãe e minha avó. Fui criada com ela, que me ensinou tudo, desde música até como me relacionar com as pessoas.” A avó também teve seu papel na paixão de Maria pela música: apesar de ser cantora lírica - Cila perdeu a voz ao usar um produto químico em uma limpeza, trabalhando como empregada doméstica -, ela, filha e neta, que moraram juntas durante 13 anos, sempre ouviram de tudo, o que hoje faz com que Maria diga que suas influências vão de "Chico [Buarque] a Backstreet Boys".
     "Minha avó entrou num processo de morte durante um ano. Descobriu um câncer, desenvolveu a metástase e foi definhando. E eu definhei junto. Virei um vegetal, tinha uns dez quilos a menos", ela diz, relembrando a avó, sua "deusa de ébano, a melhor alma do mundo". "É impossível [falar dela sem sofrer]. Mas aquela dor de apego não tenho mais. Dá saudade, às vezes choro, porque a pessoa não existe mais neste lugar físico. Claro que a gente bate altos papos, eu converso com ela horrores, faço piada."
          Pouco tempo antes de a avó morrer, ela compôs "Dona Cila" em sua homenagem, uma das oito faixas autorais de seu primeiro disco, homônimo, lançado em 2009. Maria, que pela primeira vez havia pensado em desistir de compor e cantar, ligou para a mãe dizendo que tinha, enfim, entendido que a avó "tinha que ir embora" - e cantou, ao telefone, os versos da canção.
        O clipe da música é belíssimo e conta com a interpretação da atriz Neusa Borges no papel de Dona Cila. Segundo Maria Gadú, o roteiro retrata dois grandes sonhos da avó: se apresentar em um teatro municipal e desfilar como baiana na Marquês de Sapucaí. Vale a pena conferir! 

3) A letra

De todo o amor que eu tenho
Metade foi tu que me deu
Salvando minh'alma da vida
Sorrindo e fazendo o meu eu
Se queres partir ir embora
Me olha da onde estiver
Que eu vou te mostrar que eu to pronta
Me colha madura do pé
Salve, salve essa nega
Que axé ela tem
Te carrego no colo e te dou minha mão
Minha vida depende só do teu encanto
Cila pode ir tranquila
Teu rebanho tá pronto
Teu olho que brilha e não para
Tuas mãos de fazer tudo e até
A vida que chamo de minha
Neguinha, te encontro na fé
Me mostre um caminho agora
Um jeito de estar sem você
O apego não quer ir embora
Diaxo, ele tem que querer
Ó meu pai do céu, limpe tudo aí
Vai chegar a rainha
Precisando dormir
Quando ela chegar
Tu me faça um favor
Dê um manto a ela, que ela me benze aonde eu for
O fardo pesado que levas
Deságua na força que tens
Teu lar é no reino divino
Limpinho cheirando alecrim

4) Minha história com a música

       Lembro a primeira vez em que parei para conferir os bastidores da composição de “Dona Cila” – Os versos que retratam a relação de Gadú com sua avó me deram fôlego para mergulhar no mar da história que tenho com minha avó materna!
       Quando nasci, minha mãe estava no meio do ritmo de aulas do seu curso de Pedagogia na faculdade. Logo, minha avó assumiu o comando da situação, renunciando uma série de compromissos para zelar pelos meus primeiros meses neste mundo. Hoje sinto que a força que tenho para conduzir o cotidiano possui uma ligação profunda com a troca de olhares com a minha avó.
        O trecho “ De todo o amor que eu tenho metade foi tu que me deu” define bem a minha relação com a ‘Curuquinha’. Essa mulher foi a pessoa que mais devotou amor à minha essência nesta vida. Eu via o sentimento mais sublime desabrochar em lágrimas no seu olhar nos momentos de despedidas.
        Recordo bem o seu prazer em cozinhar para mim. Minha receita predileta? Orelha de pau, coisa típica do interior. Guloseima que só avó tem “licença” para fazer. Tenho saudade do ritual da minha chegada de viagem no sertão: a ida à sua casa. O lar sempre enfeitado com um novo detalhe, a cozinha apertada, o café preto, o sorriso de canto a canto com a minha presença, a vontade de querer me agradar. Não havia necessidade de banquete, o alimento maior era a comunhão de olhares.  
       Dona Socorro era uma mulher de personalidade forte. Sem papas na língua, fazia questão de dizer que eu era o preferido entre os 23 netos que a vida lhe deu. O resultado? Thiago constrangido com a situação sendo alvo da incompreensão e de “raivas” momentâneas dos primos que não entendiam a razão de tanto afeto. Hoje nós rimos de todas as cenas passadas dignas de um filme a la “Vovózona” ou “Minha Mãe é uma peça”!
    Essa semana me questionaram: “Qual a realização da qual você mais se orgulha?” Rapidamente pensei na homenagem que fiz para ela na ocasião do seu aniversário de 70 anos: uma espécie de “Arquivo confidencial” com registros de todos filhos e netos. Vi minha avó ciente da própria história construída, as lágrimas em seu rosto expressaram a sensação de missão cumprida.
        Em 2010 fomos pegos de surpresa com a partida de ‘Curuquinha’. A antecipação da sua ida deixou sua prole órfã de olhar materno. Confesso que me surpreendi comigo mesmo: convivi bem com o luto, encarei como uma passagem que faz parte de um rumo lindo que foi projetado no momento certo. Vi sentido. Fez sentido. Para alguns da família, foi preciso perder para amadurecer. No fim das contas, as peças do quebra-cabeça se encontram para formar uma visão incrível. Carrego comigo a doce certeza neste dia 12 de outubro, data do seu aniversário, que ela está assim como Dona Cila “no reino divino limpinho cheirando alecrim!”

Confira o clipe da música!



FONTES DE PESQUISA:





Lançamento do clipe "Dona Cila" no Fantástico

Milton fala sobre Gadú







quarta-feira, 28 de agosto de 2013

"Anjos" (Pra quem tem fé)

1) A banda

Zelar a revelação das várias faces dos dilemas brasileiros. Talvez seja essa a missão velada das composições da banda “O Rappa”. O nome escolhido para batizar o grupo já aponta o cuidado com várias questões sociais. Marcelo Lobato - integrante da banda - explica a origem do nome: “Quem sacramentou a parada foi um amigo da gente, que é uma figura folclórica lá de Santa, o Zulu. O nome veio a calhar… tudo a ver com o som que a gente tava fazendo na época. Aí a gente já associou com a coisa da rua. Chamam de ‘rapa’ os caras que fiscalizam os ambulantes no Rio de Janeiro, os caras que recolhem a mercadoria, enfiam a porrada, enfim, aquela coisa horrível. Tem a ver com a coisa do rap também, e aí a gente colocou um outro ‘P’ só pra não confundir.”

                                         Capa do novo cd - Arte do paraibano Mike Deodato Jr.

O repertório do quarteto - Marcelo Lobato (bateria), Xandão (guitarra), Lauro Farias (baixo)  e Marcelo Falcão (Vocalista) – passeia por vários temas que promovem reflexões compromissadas com as lutas cotidianas. Nas suas letras são contadas histórias daqueles seres que vivem nas entrelinhas, dos que lutam bravamente para conquistar o direito mais básico: viver com dignidade.
O grande trunfo presente nas canções d’O Rappa consiste na demonstração do quão forte é a fé que nos movimenta. “Reza Vela”, “Minha alma”, “Meu santo tá cansado”, “Súplica Cearense” e “Pescador de Ilusões” são algumas amostras de canções com nomes sugestivos que comprovam a crença em tal potencial. 



2) A composição
 (Marcelo Falcão)

"Essa música é uma declaração de superação. Há pouco tempo O Rappa ia acabar, tivemos problemas com empresários e ficamos afastados por mais de um ano. Mas o que eu tinha era fé para que voltássemos a sermos amigos. E a música 'Anjos' veio para nos reerguer e selar a união", disse o compositor em entrevista para o Uol.
A história do novo disco fala sobre a história da banda – superação. A gente tava vendo nossa carreira ser conduzida de uma forma não legal. E não dava tempo de gritar porque tinham muitos shows marcados. Nós passamos por um processo difícil em que eu e o Xandão ficamos sem falar pelo menos metade da turnê. A gente tinha certeza que o melhor seria dar um tempo. Forçamos um pouco as nossas férias, cada um foi pra um canto e nesse momento aconteceram várias coisas em minha vida” conta Falcão na série de vídeos “Pra quem tem fé” disponível no canal da Warner Music no Youtube.
                                Assista a série "Pra quem tem fé" no canal da Warner no Youtube

“A minha família religiosamente falando é católica, mas eu acredito na fé. Minha fé não tem religião, ela abrange tudo – ela vai conversar com macumbeiro, evangélico, católico, etc. Quando eu precisava de uma resposta para saber se a banda ia acabar ou não foi quando já tinha passado um ano e aconteceram muitas coisas –meu noivado acabou, minha banda acabou. E eu não sou um cara deprê, sou um cara muito “up”. Foi uma hora que eu comecei a usar mais o estúdio que tenho em minha casa. [...] A primeira pessoa que eu mostrei (a composição)  foi para minha mãe – ela ficou um tempão sem falar no telefone, chorando.” – revelou o autor da música.

      Lauro Farias, integrante da banda relata que:
 “A história dessa música ao meu ver é relacionada a fé espiritual de cada ser humano. Nós vivemos dias tão loucos, estamos sempre sob a iminência de que alguma coisa não está legal e a vida não é assim. Nós estamos vivendo um momento muito delicado em que a banalização da vida é eminente. Ela intitula o lance de você buscar um lugar em que você possa raciocinar, ter felicidade plena. Eu sinto necessidade de ouvir  essa música toda hora, nunca aconteceu algo desse tipo antes.”
      O novo trabalho celebra uma vitória. Como bem disse Falcão: “Este cd é uma história de luta. Amor ao “Rappa” em primeiro lugar!”

3) A letra

Oh Lord, oh Lord, oh Lord, oh Lord
Lord, Lord, Lord, Lord
Oh Lord, oh Lord, oh Lord, oh Lord
Lord, Lord, Lord, Lord

Em algum lugar, pra relaxar
Eu vou pedir pros anjos cantarem por mim
Pra quem tem fé
A vida nunca tem fim
Não tem fim
É

Se você não aceita o conselho, te respeito
Resolveu seguir, ir atrás, cara e coragem
Só que você sai em desvantagem se você não tem fé
Se você não tem fé

Te mostro um trecho, uma passagem de um livro antigo
Pra te provar e mostrar que a vida é linda
Dura, sofrida, carente em qualquer continente
Mas boa de se viver em qualquer lugar
É

Volte a brilhar, volte a brilhar
Um vinho, um pão e uma reza
Uma lua e um sol, sua vida, portas abertas

Em algum lugar, pra relaxar
Eu vou pedir pros anjos cantarem por mim
Pra quem tem fé
A vida nunca tem fim
Não tem fim

Podem até gritar, gritar
Podem até barulho então fazer
Ninguém vai te escutar se não tem fé
Ninguém mais vai te ver

Inclinar seu olhar sobre nós e cuidar
Inclinar seu olhar sobre nós e cuidar
Inclinar seu olhar sobre nós e cuidar
Inclinar seu olhar sobre nós e cuidar

Pra você pode ser
      A fé na vitória tem que ser inabalável

4) Minha história com a música

Tenho cultivado uma espécie de conexão com os anjos no cotidiano: no momento em que acordo, direciono o meu olhar para o Céu, observo o verde da natureza que consigo alcançar e mantenho os pés firmes no chão. O desdobramento do ato me dá a noção do quão grande este mundo é.
Convivo com a arte de transformar o ambiente em que transito em lugar sagrado. Um constante desafio toma conta desta mente hiperativa: ter um momento de introspecção para conseguir conectar minha essência com todos os guias espirituais que me cercam. Quando escuto o trecho “Inclinar seu olhar sobre nós e cuidar” me imagino de braços abertos recebendo emissões de ondas energéticas muito fortes. Meu corpo inteiro vibra no momento em que escuto cada sílaba dita – nesta parte da música, a experiência torna-se surreal. Sinto raios solares movimentando toda minha região torácica!
 Entretanto, mesmo ciente do êxtase, tenho que me policiar: com medo de perder algum trecho da viagem neste mundo movido por tanta pressa, acabo dando mais valor à ação do que a oração. Falha minha, falha nossa.
Inseridos em uma realidade de discursos religiosos tão incoerentes com a verdade que impulsiona o coração, somos movidos por dias que colocam em descrédito a nossa fonte de abastecimento.
Hoje eu me recuso acordar e ligar o piloto automático. Antes do “Play”, que venha a contemplação do “Pause” da introspecção, quero optar pela conexão da gratidão com minhas preces, quero a lapidação dos meus potenciais e a clareza na percepção dos meus objetivos. E, por fim, quero ter a consciência de que só no momento em que estiver conduzido pela oração, poderei encontrar plenitude na ação.
É preciso buscar constantemente serenidade para conduzir esta vida que é “dura, sofrida, carente” de olhares alimentados pela fé.
Dia sim, dia não, me deparo com pessoas que estão perdendo aquilo que há de mais precioso no ser humano: o brilho no olhar. Vejo vidas engessadas, olhares opacos conformados com o tom cinza dos dias ruins. Gente que não vive, apenas sobrevive.
Não preciso ir longe para retratar minha preocupação: há algumas semanas ao bater na porta da casa de uma amiga, me vi diante de suas lágrimas portadoras de uma profunda angústia.
O motivo: a escravidão da vida de concursos. Refém da rotina de estudos há um bom tempo, calejada pelas pedradas, ela anda em torno da dura espera daqueles que procuram seus nomes na lista de aprovados.
Sei o quanto esse processo é doloroso. Entretanto, nos compete a seguinte missão: colorir o longo percurso que precede a linha de chegada. 
Infelizmente, nos deparamos com notícias de pés cansados que desistiram da corrida no meio do caminho. No mês passado fui impactado com a ligação que revelou o suicídio de um colega de infância. 27 anos, prestes a concluir o curso de Medicina, ele resolveu antecipar sua passagem. A pergunta disparou na minha mente: Por quê? Logo em seguida, respirei fundo para colocar em prática a lição que aprendi: não tenho o direito de projetar respostas alheias de acordo com minhas convicções. Além dele, a causa também foi sepultada. Quero manter longe de mim os questionamentos sobre a realidade que não pode ser mais mudada!
Escutei o verso “Volte a brilhar” no dia de sua morte. Queria ter tido a chance de dizer isso pra ele. Acredito que temos o poder de ofertar o colírio certo para dilatar a visão dos que convivem conosco.
Faço minhas as palavras de Fabio de Melo em seu livro “É sagrado viver”: “Eu tenho pedido a Deus a graça de perceber os que sofrem em segredo. Fico atento. Neste tempo tão marcado pela pressa, eu me esmero para ler nos silêncios as dores escondidas”.
Com base em tais razões, sou movido a cantarolar para minha amiga e para tantos que vivem o tempo de espera: Voltem a brilhar enquanto há tempo. Abasteçam-se de vinho, pão e reza. Abracem a Lua e o Sol. Abram as portas e o campo de visão: queiram preencher os detalhes do cotidiano com as cores mais vivas, pois, afinal de contas, “o mundo é bão, Sebastião!”.


                                                           Confira o Clipe da música!

FONTES DE PESQUISA:










domingo, 18 de agosto de 2013

Cd "Sei" de Nando Reis

1) O Artista

O que falar do paulistano José Fernando Gomes dos Reis?
Que ele abandonou a faculdade de Matemática em 1982 para deixar marcas eternas na minha vida?
Que ele hoje está no patamar dos 10 maiores arrecadadores de direitos autorais no Brasil?
Sou suspeito para falar.
O seu trabalho com metáforas me fascina. Vejo um cantor multicolorido que transcende toda a lógica. O Nando é solar, é laranja, é de Marte!



Suas músicas promovem uma comunhão com o mais alto nível de desprendimento. A abstração dos seus versos enriquece minha mente.
Mantenho a crença de que uma alma tão viva tenha submetido o seu corpo a rabiscos por tatuagens ainda na maternidade.  
É um homem que transborda artes pela pele, olhar e voz  – No dia em que me deparei com a sua presença, constatei o quanto o seu olhar é expressivo e curioso.
É um ser que está anos-luz à frente da época em que vivemos. Um visionário.

2) As Composições

Não trato a música com esse conceito de mensagem. A forma como as pessoas se relacionam com a música depende ou estabelece uma relação de liberdade, de interpretação.  Não há nenhum código que eu queria fixar na cabeça das pessoas. Simplesmente faço as músicas de acordo com aquilo que sinto, na forma como gosto de escrever, sobre os assuntos que gosto. Depois disso, as pessoas fazem com ela o que bem entender.” - Entrevista para revista Cult.

Com essa fala Nando arremata o meu pensamento sobre as relações que as pessoas mantêm com as músicas. Eu conheci o cd “Sei” em novembro de 2012. Após escutar  todas as faixas ininterruptamente, atestei a minha paixão. Neste mês de agosto, consolidei o amor que tenho pela obra: elegi todas as 15 músicas para comandar a trilha sonora das minhas férias em João Pessoa.  O casamento foi lindo: as melodias inebriantes preencheram meus ouvidos. Sou capaz de atestar o seguinte feito: certos versos viraram nuvens e eu estive sobre elas no céu da capital paraibana enquanto meu corpo estava na direção do carro em algum engarrafamento.

Vou listar 6 músicas que despertam os meus sentidos:

a) Pré-sal


"Mamonas assassinas com mamilos polêmicos
A Lúcia elucida o enunciado totêmico
Petróleo dos primórdios nossa terra foi feita
O asfalto fonoaudiólogo episódio neurológico
A terraplanagem perfeita"

“Pré-sal” é uma música que parece não ter nexo, é “fora da casinha”. Nando apertou o botão “Abstração Mode ON” na hora de escrevê-la. São mais de 7 minutos de palavras aparentemente desencontradas!  “O título foi dado pela minha irmã, e é como se falasse aquilo que é a pré-consciência, são fatos da minha própria infância. E a música tem um tipo de furor que eu acho adequado  para musicas de abertura”, disse o compositor em entrevista para a Revista Cult.  

A música tem uma melodia ideal para abertura: as notas me fazem enfiar o pé na estrada da descontração. Rodo um clipe na minha cabeça toda vez que escuto tal música!

b) Back In Vânia


“Tenho cinco filhos, fiz uma família”
“Entrei, saí, cheguei, parti, chorei, sorri, amei, sofri, matei, morri e ela estende sua mão”

“Back In Vânia” é uma música em que o rei faz um balanço da sua vida: carreira, família, perda de sua amiga e parceira Cássia Eller e, por fim, o retorno do seu casamento com Vânia, sua primeira esposa, mãe de 4 dos seus cinco filhos.
A música é desde já um grande clássico para os fãs, tendo em vista o detalhamento da vida movimentada do rei em versos. Em março conquistei uma oportunidade única: ganhei uma promoção para poder conferir a passagem do som do astro em Porto Alegre (Com direito à entrevista para o Patrola, programa da RBS, filial da Globo do RS). Após o ensaio, fui agraciado com a troca de algumas palavras com ele. A experiência superou minhas expectativas: a simplicidade do mestre estava na minha frente de sandálias havaianas.

Link da minha entrevista:

c) Sei


“E o beijo esperado ainda está molhado
E guardado ali
Em sua boca
Que se abre e sorri feliz
Quando fala o nome daquela pessoa
Quando quer beijar de novo e muito
Os lábios desejados da sua pessoa”


Sei é o tipo de música que brota em mim a vontade de viver uma louca paixão só para poder tê-la como carro-chefe da trilha sonora do romance. Perguntado sobre o nome da música que batizou o disco, Nando afirma que “Sei é  o nome de uma música que eu adoro, ao mesmo tempo em que tem uma ideia de que é uma afirmação e é muito menos do que isso. É aquele “sei” que você diz quando está conversando com outra pessoa e acaba sendo impactado por uma quantidade de novidades, informação. Eu gosto desse nome.” Sei me faz suspirar. 

d) Coração Vago



"Não tenho dúvida, é com você que eu quero viver
Mas outras dúvidas eu tenho e elas me atrapalham
Não é um conceito ou um defeito, é só o meu jeito de ser
Sou um sujeito imperfeito
Mas o lado esquerdo do peito
Por inteiro te ofereço
Meu coração vago"


Quando escuto esses versos penso em registrar em cartório a seguinte vontade: ter esta música cantada na celebração do meu casamento. Me imagino despido de todas as vontades, nu, focado no olhar da pessoa amada, entregue a relação ao ponto de ofertar o coração que durante tanto tempo vagou em busca de autocompreensão.

e) Eu e a bispa



''Não há seita que não queira ser universal
Não há certeza que convença e seja universal''

Nesta música, Nando Reis volta a fazer críticas ácidas às religiões (a primeira crítica forte ao tema aconteceu na década de 80 com a música “Igreja”, em um álbum dos Titãs). Ps.Dizem que também é uma alfinetada direcionada à Gravadora Universal, gravadora que rompeu contrato com o Nando.
 Quem me conhece sabe que tenho uma formação católica bem consistente. Entretanto, hoje tenho como certo o seguinte pensamento: cada religião deve ter a garantia do seu espaço. Acredito em todos os sistemas de crenças comprometidos com o ser humano e o bem estar do universo. Considero válidas todas as experiências que impulsionam o crescimento. Ando quebrando paradigmas, me livrando de preconceitos, aprofundando conhecimentos para poder mergulhar em oceanos até então não explorados.

f) PersXspectativa



"Estranha a espera
Deixa o pensamento veloz"

A suavidade do encaixe da melodia com a letra desta música norteou minhas expectativas nos últimos dias. O estranho sentimento de liberdade até então não provado em seus aspectos mais profundos tomou conta do meu ser. Renasci neste mês de agosto. Sinto que a partir de agora o gosto que provo no cotidiano está muito mais apurado. Coisa de gente comprometida com a coragem de viver. O pensamento antes veloz e descompassado agora inspira e respira com mais leveza. Sinto tal movimentação com a minha base familiar – tenho cumprido o exercício de parada obrigatória nos semáforos. Parar para fazer “Check-up”, para sair do acostamento da indiferença e aprender a “cortar luz” nos momentos em que for preciso manter quem mais amo em estado de alerta. O meu compromisso é com a condução da viagem – quero sempre estar disposto a ser uma boa companhia que busca a melhor estação de rádio no som e o compartilhamento de histórias divertidas para fazer com que o tempo na estrada não seja um fardo e sim, motivo de prazer.


Cá estou tendo que lidar com este vulcão de sensações que a musicalidade do Nando Reis desperta em mim. O cd "Sei" já tem lugar garantido na minha estante, é uma obra sublime que cativou meus ouvidos. Após toda essa erupção, só posso finalizar com a seguinte alusão a clássica “All Star” : “Estranho seria se eu não me apaixonasse pelo Nando.”



Afim de comprar o cd?

Só há duas formas possíveis: Pelo site oficial do cantor, em que você pode escutar todas as faixas e avaliar quanto acha que o cd vale. O que isso significa? Que toda semana a equipe faz uma média dos valores ofertados e vendem o cd pelo valor semanal estipulado por todos que passaram pelo site e deram sua contribuição. Ou seja, o cd oscila de valor – Já houve dias em que pessoas compraram até por R$8. Fantástico, né?!


Outra forma possível: comprar pessoalmente no show do Nando. Comprei o meu no show dele em Poa. Reze para que a turnê “Sei” passe pela sua cidade”!

Até a próxima! ;D




sábado, 20 de julho de 2013

Rua da Amizade

Tento fugir do óbvio. Sou um homem avesso aos clichês.
Mas confesso que fui vencido neste dia 20 de julho pela onda de homenagens e post's acerca da comemoração do Dia do Amigo (Sim, eu tinha programado a publicação de um texto 'caliente' neste espaço hoje! -  o qual ficará para uma próxima ocasião).
Selecionei, então, versos de 6 composições que se encontram na esquina da Rua da Amizade.


"Se não fossem as amigas que eu posso contar
Não sei o que seria de mim

Pois quem tem amigas não chora sozinho

Sem elas seria meu fim"

Os versos de " Amigas" de Nando Reis e Wando conseguem sintetizar bem a importância dos olhares que testemunharam minhas quedas mais doloridas. Pessoas que me deram colo e que participaram efetivamente do processo de cicatrização das feridas internas. Mentes que souberam conviver com minhas lágrimas, mas que tiveram pressa de ver sorrisos estampados em meu rosto.


"Você que me diz as verdades com frases abertas, 
amigo você é o mais certo das horas incertas"
Tá. Faço parte da cota de gente sensível (e estranha demais!) que se emociona toda vez que escuta  "Amigo", composição do Rei Roberto e do Tremendão Erasmo Carlos. Enquanto preparava estes escritos parei para assistir o clássico dueto. Choramos copiosamente: Eu, Roberto e Erasmo. É muita comédia, Brasil!


"Tô contigo, amigo e não abro
Vamos ver o diabo de perto"
Eu aceito o convite feito por Gonzaguinha na sua canção "Recado".  Sempre fui (e ainda sou) adepto do partido da conciliação. Preciso aprimorar minha vocação de conselheiro de relações - uma coisa meio "Hitch", personagem clássico de Will Smith. Gosto de colocar meus amigos diante do espelho. Penso que é chegada a hora de fazer a faxina de várias situações mal resolvidas para poder conduzir a caminhada livre dos pesos colocados em nossos ombros. É preciso encarar o diabo de perto para poder tomar posse de si. Neste momento de medo e introspecção, olhares amigos surgem e apertam nossas mãos. O calor do tato confirma "Estou aqui, caso precise!".



"Você pra mim é mais que uma irmã
Aliança de fé

Amizade que é fruto do sonho de Deus"
Os versos celebram a amizade das cantoras Carol Celico e Claudia Leitte, intérpretes da canção "Mesma Luz". Lembro a primeira vez que fui embalado por essa melodia: instantaneamente revisitei as gavetas da minha memória em que guardo os registros dos dias em que encontrei pessoas especiais. Sou um homem apaixonado por olhares. Neste exato momento recordo com precisão encontros sublimes com pessoas que eu não sabia que ganhariam espaço tão grande em minha vida .Pessoas pelas quais nutro sede de conversas demoradas.



"Pois, seja o que vier,
venha o que vier

Qualquer dia amigo eu volto a te encontrar

Qualquer dia amigo, a gente vai se encontrar"
Não podia deixar de falar sobre a clássica "Canção da América" de Milton Nascimento. A música que virou hino de conclusões de cursos e fechamento de etapas importantes da vida dos brasileiros tem um tom todo especial para meus ouvidos. Sou um andarilho, estou sempre em movimento - e este estado me proporciona amizades muito intensas. Como vivo muito o presente, acabo não acompanhando o cotidiano de muitas pessoas amadas que agora estão distantes. Peco pela omissão, mas prometo recompensa com a emissão de energia boa através das ondas de pensamento. 


Amo muito minhas paixões. Renovo meu querer bem por cada amizade parafraseando os versos de "Banda Eva":
"Quero encontrá-los sonhando sempre em cada esquina!"









sábado, 13 de julho de 2013

Caçador de Mim

 1) O intéprete

       Toda vez que escuto o timbre da voz de Milton Nascimento chego a ficar paralisado. Ouvi-lo é garantia de conforto, é símbolo de pausa necessária para respirar tranquilamente em tempos de relações tão líquidas. Cultivá-lo na “playlist” cotidiana é arte sagrada.  Não é à toa que Elis Regina dizia que “Se Deus cantasse, seria com a voz de Milton”.  
     Nascido no Rio, o cantor foi adotado por uma família mineira após a morte de sua mãe biológica. O estado de Minas Gerais foi o terreno fértil da obra do cantor que na adolescência “queimou a inscrição para o vestibular de economia e decidiu que a música seria o seu futuro, essa era a única garantia. De lá para cá, conseguiu não apenas viver da música, como viver a música na sua plenitude.”
         Ano passado realizei um sonhei de consumo: fui para o show da sua turnê “50 anos de voz nas estradas” em Porto Alegre. Presenciei uma performance contida pelos poucos movimentos no palco devido o seu estado de saúde. Mas essa situação não retirou o brilho daquela noite marcada por arrepios (e algumas lágrimas). Anestesia pura!

2)História da composição 

        Caçador de mim tornou-se conhecida do público em 1981, resultado da parceria entre Sergio Magrão e Luiz Carlos Sá. O primeiro apresentou a melodia e o segundo escreveu a letra que teve como inspiração o livro “O apanhador no campo de centeios” que conta a história de um jovem que é expulso da escola por seu mau desempenho e no regresso para casa passa a refletir sobre sua curta vida, decidindo procurar pessoas importantes para entender a confusão que passa pela sua cabeça antes de uma conversa com seus pais. O que marcou o compositor?:  “O cara se procurando e tentando achar a personalidade dele”, disse Luiz Carlos. Um parêntese curioso: O mesmo livro que baseou a concepção desta música tão viva foi alvo de “inspiração” para Mark Chapman assassinar John Lennon, em 1980. Teria sido o personagem do livro – segundo ele – que inspirou-lhe a cometer o crime.
      Sergio Magrão conta os bastidores de Caçador de mim: Milton Nascimento conheceu a música na condição de produtor de um LP da Banda 14 Bis. A paixão foi tão arrebatadora que decidiu não apenas gravar a música, mas colocá-la como título do seu álbum. Ele ainda lembra a primeira vez que escutou a música na voz do ícone: “Eu estava na arquibancada do palco. De repente começou um solo e eu falei: 'Conheço essa harmonia'. Ele virou para mim e começou a cantar, eu desabei. Comecei a chorar. Eu estava com um amigo meu que falou ‘Cara, é a tua música!’. E ficou lindíssima!”
                                                             O livro que inspirou a canção

3) A letra

Caçador de Mim
Sérgio Magrão e Luiz Carlos Sá
 
Por tanto amor, por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz, manso ou feroz
Eu, caçador de mim
Preso a canções
Entregue a paixões que nunca tiveram fim
Vou me encontrar longe do meu lugar
Eu, caçador de mim
Nada a temer
Senão o correr da luta
Nada a fazer
Senão esquecer o medo
Abrir o peito à força
Numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura
Longe se vai sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir o que me faz sentir
Eu, caçador de mim

4) Minha história com a música

      “Vou me encontrar longe do meu lugar” Há 7 anos deixei o aconchego do meu lar disposto a encarar o desafio de buscar meu próprio caminho. Ao longo dos últimos anos segui os sinais expressos na estrada. Hoje, cerca de 4 mil km me separam de casa. Nunca deixei os medos dominarem minha mente. Conduzi bem todas as angústias primárias: a distância da família, o fato de não conhecer ninguém no mundo novo. Fácil? Não foi. Mas a impressão que tenho é de ter ancorado no porto certo. Estou encontrando Thiago em Porto Alegre!
        “Vou descobrir o que me faz sentir”. Neste espaço firmei meus pés com uma vontade: descoberta da felicidade. E para isso é preciso provar. Testar a vida! No cotidiano mais simples ando encontrando respostas. Apresento um exemplo: nunca fui motivado para aprender a cozinhar. Somente com 25 anos despertei para assumir o comando do fogão. Hoje preparo meu almoço – ando experimentando os temperos que me libertam da monotonia. Surpreendo-me ao ver rúcula e alface nos meus pratos – elementos verdes antes impensáveis de serem colocados na dinâmica da minha alimentação. O motivo? Ignorância, nunca tinha provado. Preferia manter o meu preconceito!
        Esta fase de descobertas, permissões e quebras de conceitos provoca reflexões profundas – e uma dose de boas risadas! Há 2 meses minha terapeuta questionou: “Você já pensou em fazer teatro?” Eu ri, respondi que não tenho dom para exercer esta arte. Ela retrucou: “Você já testou, já teve alguma experiência? Por que você não se permite?” Aquela conversa mexeu comigo. Semanas depois entrei em uma pizzaria e me deparei com um anúncio de uma oficina de teatro de rua. Meus olhos brilharam! Resolvi enviar o meu currículo e dar a cara à tapa. Fui aceito! Meu contato inicial com o universo lúdico do teatro foi uma experiência libertadora, captei um desprendimento raro nos movimentos e olhares empreendidos. Minha mente inquieta ganhou fôlego ao mergulhar neste colorido mar de possibilidades!
       Nesta época de lapidação, nada de relacionamento. Por ora, apertei o botão “Pause”. Acredito que só poderei firmar compromisso quando acontecer um processo profundo de tomada de consciência dos meus gostos, traumas, limitações e virtudes. Vejo que é preciso preparar bem o terreno antes do plantio da semente para minimizar os riscos de uma relação infrutífera. Optar por investir em alguma relação impulsiva significa - hoje - infringir o meu estatuto. Questão de honestidade e franqueza.
         É preciso investir muito nestas missões que estou abraçando: cozinha, palco e coração. Mas, diante desta tela renovo mais uma vez um pacto comigo mesmo: vou prosseguir aberto para experimentar as novas ações que estão movimentando o meu ser. Continuo aqui. Eu, caçador de mim!

5) Confira a música